segunda-feira, março 15, 2010

Suponha que a tal mulher do post abaixo decida deixar de ser sozinha. Ela tem as seguintes opções:

Um milionário - "Ah, é para sustentá-la."
Um pobretão - "Ele está com ela pela grana."
Um bonitão - "Com certeza ela é chifrada."
Um cara mais velho - "Ela está procurando uma figura paterna."
Um cara mais novo - "Ela está entrando na menopausa."
Um homem de outra nacionalidade - "Ela é excêntrica."
Um chefe - "Ela só quer ser promovida."
Por que não podemos andar pela vida sozinhas?

Experimente ser solteira. Ouse ter mais de 35 anos. Atreva-se a acordar de mau-humor. Fatalmente ouvirá, em tom alto o suficiente para que todos em volta escutem: "Coitada, não tem homem em casa!".

A maioria dos comentários não vem da ala masculina, como seria de se supor. Mulheres são muito cruéis quando se trata de outras mulheres. Estar casada, ainda que num casamento infeliz, representa uma espécie de passaporte com visto para a perversidade. Ao contrário da "coitada" histérica, a casada tem um homem em casa.

A importância social de ter um par é muito maior para as mulheres. Homens sozinhos são geralmente infantis e autodestrutivos, mas transitam socialmente sem constrangimentos. Mulheres sozinhas são simplesmente digans de crítica – e estão elas mesmas extremamente desconfortáveis no papel de solitárias. Quando não são claramente discriminadas.

Cedendo à pressão social, mulheres bacanas frequentemente se sujeitam ao convívio de homens muito aquém delas em inteligência, cultura e caráter. Não há o equivalente masculino de “ficar para tia”. Do contrário: o sujeito que permanece na farra é visto com inveja. É o cara que aproveita a vida e "sabe viver".

Um amigo meu, professor de francês, comentava a respeito dos intelectuais franceses de esquerda que conhecera. Estes costumavam visitar países do Terceiro Mundo, o Brasil em particular, e se hospedavam em hotéis cinco-estrelas. Ao lado da piscina, servidos de champanhe francês pelos serviçais do Terceiro Mundo, faziam comentários, observando trabalhadores mestiços:

“Vejam o que o capitalismo faz com estas pessoas...”

Esses intelectuais receberem salários pagos pelos contribuintes franceses, mas toda a sua colaboração se resume a frases como essa.

Onde estão os nossos intelectuais de esquerda, diante das violações dos direitos humanos em Cuba? Em algum resort capitalista, bebendo Veuve Clicquot?

quarta-feira, março 10, 2010

Escrever impede a conjugação dos outros verbos. Os dedos sobre o teclado e lá fora a vida estourando, não só em desgraças mas também em dádivas de toda espécie.

Escrever o quê, se não me concedem tempo para isto entre dois eventos que desabam como bombas - já redigi o capítulo „Alemanha“, e para o próximo, „Brasília“, falta inspiração e coragem?

Sempre tive muito medo de criar um texto tão melodramático e sentimental que fosse capaz de me constranger. Hoje, no entanto, não tenho coragem de tratar de assuntos menos importantes para o meu coração.

Por isso é que hoje escrevo sobre o impacto que a morte de uma bola emplumada de meio quilo pode provocar.

Ele infelizmente não viveu o ocaso de uma vida longa e cheia de acontecimentos.

Era um papagaio comum, que recheou o meu cotidiano com birra, ternura e ataques de ciúmes. Dele recebi, inesperadamente, a acolhida mais calorosa no meu retorno ao Brasil. A sensação de perda teve uma intensidade totalmente imprevista.

O que mais dói é não ter tido tempo de tê-lo ensinado a dizer „Ich liebe dich, Schatzi.“
"Wer neue Heilmittel scheut, muss alte Übel erdulden."

Francis Bacon

"Der Bettler scheidet ebenso schwer von seiner Armut wie der König von seiner Herrlichkeit."

Schiller