terça-feira, novembro 23, 2004

Jornal da Tarde, 31 de novembro de 1992:

“O executivo japonês que estiver dedicando excessiva atenção à família ou à sua vida particular tem onde reencontrar o caminho da adoração à empresa. A Escola de Reeducação de Executivos foi criada em 1979 por Anji Kobayashi e hoje tem cinco filiais espalhadas pelo país. A idéia é trazer, através de duros exercícios físicos e lavagem cerebral, o homem de negócios ‘com dúvidas’ de volta à realidade: a empresa deve ser o primeiro e único amor de qualquer executivo japonês que se preze.

A matriz é freqüentada por 2.500 pessoas por ano, que pagam o equivalente a US$ 3 mil por um curso de 13 dias. O aluno deve superar provas como marchar 40 quilômetros à noite e ficar três horas ininterruptas ao telefone. A escola só entrega o certificado ao ter certeza absoluta de que o executivo deixou de dar prioridade à família ou à sua vida pessoal. Em agosto o diretor de uma firma de computação morreu em Nagasaki, vítima de exercícios. Entre outras coisas, os alunos da Japan Inc. precisam decorar as centenas de números de telefone de sua agenda e ficar sem ir ao banheiro durante 12 horas, turno normal de um executivo japonês.”

terça-feira, novembro 16, 2004

Sonhar
Mais um sonho impossível
Lutar
Quando é fácil ceder
Vencer o inimigo invencível
Negar quando a regra é vender
Sofrer a tortura implacável
Romper a incabível prisão
Voar num limite improvável
Tocar o inacessível chão
É minha lei, é minha questão
Virar este mundo
Cravar este chão
Não me importa saber
Se é terrível demais
Quantas guerras terei que vencer
Por um pouco de paz
E amanhã, se este chão que eu beijei
For meu leito e perdão
Vou saber que valeu delirar
E morrer de paixão
E assim, seja lá como for
Vai ter fim a infinita aflição
E o mundo vai ver uma flor
Brotar do impossível chão

Sonho impossível
J. Darion – M. Leigh

sábado, novembro 13, 2004

Excesso de trabalho e autorização social

O trabalho em excesso foi erigido à categoria de verdadeira virtude. Pessoas são incentivadas a trabalhar 14 horas por dia, como no início da revolução industrial.

É a pedagogia do medo. Busca-se o máximo de produtividade, numa lógica de competição que destrói quaisquer vínculos humanitários. Salve-se quem puder e eu vou competir com você, nós dois vamos competir com a equipe do lado, a equipe do lado vai competir com a outra.

É preciso conseguir a autorização social que destruirá o mito do trabalho realizado sob premissas e condicionamentos ultrapassados. Trabalhar mata sim, e não dignifica ninguém.

Um beijo que deveria inaugurar uma nova fase da vida traz à tona somente lembranças fortes. Não é preciso comparar o estímulo: apenas as sensações provocadas. É constrangedor beijar alguém e morrer de saudades do antecessor.

Um novo amor transforma o que era opaco em transparência. O anterior era realmente amado. Caso contrário eu não sentiria esse abandono, essa perturbação, essa forte impressão de que todas as tentativas serão inúteis.

quinta-feira, novembro 11, 2004

Recebi o texto abaixo de uma amiga que corresponde à sua exata representação.

"Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. A mim não interessam os bons de espírito, nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim. Para isso, só sendo louco. Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças. Escolho meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta. Não quero só o ombro ou colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis nem choros piedosos. Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas que lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei que normalidade é uma ilusão imbecil e estéril."

Oscar Wilde

quarta-feira, novembro 10, 2004

Por quê ter medo de perder o que já não se quer mais?

segunda-feira, novembro 08, 2004

Relatividade

Vivemos a Era da Incerteza. Tudo "depende", "talvez", "pode ser". É hora de restaurar o rumo da História, reconhecendo a existência de verdades absolutas e irrefutáveis.

Não existe meio viado. Ninguém deixa de ser viado. Ninguém é "só um pouquinho" viado. Essa é uma das mais bem definidas verdades universais. Beijou um homem, se roçou com um igual ou pensou em fazer qualquer coisa parecida, é viado e pronto.

Todo mundo se arruma para ir à peça “Os sete afluentes do rio Ota”. Você também, afinal quer saber o que é isso. As outras pessoas fingem que gostam, enquanto você dorme. Elas entenderam a obra e você não. Ta vendo como as coisas seriam muito mais simples se as verdades fossem restabelecidas? Uma peça com seis horas de duração é necessariamente chata! Aliás, teatro é muito chato. Só vai ao teatro quem é ator, quem quer ser ator ou quem é amigo de ator.

É difícil conviver com a idéia de que existem coisas rígidas e imutáveis. É necessário, entretanto, derrubar a hipocrisia construída por alienados que desejam mascarar a verdade. O mundo é real. Não precisamos dessa infame sociedade alternativa.

O Intelectualóide

Aprendeu a ler com dois anos de idade, e seu primeiro livro foi "A Tartaruguinha Revisionista Contra o Coelho Arrivista." Consciente da importância dessa fase da vida, o bebê intelectual tem uma vivência altamente crítica. Passa rapidamente pela fase anal e supera o Complexo de Édipo com certa desenvoltura, mas encontra dificuldade na fase oral. Isto é, não consegue calar a boca pelo resto da vida.

Enquanto as outras crianças quebram tudo, jogam bola na vidraça, brincam de casinha ou de médico, o intelectual brinca de psicanalista, crítico de arte, porta-voz da presidência, sindicalista ou secretário-geral do PSTU.

Aos 13 anos, acontece um fato marcante na vida intelectual: ele ganha um óculos. Apesar das idéias liberais, a armação é das mais conservadoras.

Aos 14 anos, o jovem intelectual vai assistir à semana de cinema finlândes na Cinemateca do MAM. Em sua terceira leitura de "Ulisses", de James Joyce, o jovem intelectual escreve uma resenha para o jornal acadêmico, redigido por ele e lido pelo diretor da escola.

Aos 15 anos, rompe com a família e vai morar no banheiro.

A universidade é uma lembrança agradável na vida do intelectual. Ele prestou vestibular para Administração, mas cursou metade do curso de Letras, de Sociologia e de Filosofia. Seu sonho de verdade, no entanto, é ser diretor de cinema. Faz então o seu primeiro filme, com uma filmadora Panasonic emprestada. A partir daí se intitula cineasta e passa a falar mal do cinema nacional. Faz poesia alternativa. Seu pai edita e compra todos os exemplares de seu livro "Canto Só".

Aos 40 anos, o intelectual retorna à vida pública. É eleito secretário-geral, fundador, proprietário e culpado pelo Partido Socialista Comunista Dialético-Materialista Brasileiro.

Finalmente, aos 50 anos, compra uma sunga, entra pro PV, cheira pó, injeta cola e comete todo o Código Penal.

sexta-feira, novembro 05, 2004

Homens histéricos e Amores Líquidos

Sedução sem entrega é o que caracteriza o comportamento do homem histérico, tipinho extremamente comum que nunca realiza o jogo no qual investe.

Ninguém os aguenta mais, com seus amores portáteis e suas interações frenéticas em substituição ao conhecimento efetivo do outro.

Separar amor de sexo ainda é a defesa neurótica mais comum do homem histérico. Ou melhor: é a única capaz de evitar a confusão entre o amor infantil que ele ainda sente pela mamãe com o desejo sexual por uma mulher.

Mulher para transar e mulher para namorar são, para o histérico, categorias excludentes. As mulheres desta geração, contudo, presenciaram raríssimos casos nos quais ocorreram passagens de uma categoria à outra, e assim vivem na ridícula esperança de que, se aparentemente toparem o jogo do sexo casual, a tão desejada transição acabará acontecendo.

Sexo casual é objeto de consumo, como qualquer outro: é possível medir o quanto se vai investir e quanta satisfação renderá. Já para o amor não há garantia. É necessário enfrentar o convívio com o outro, com todas as suas dificuldades e compromissos. Nenhum homem histérico quer pagar o preço dos encargos e tensões inerentes à construção de um relacionamento.

Por outro lado, quem foi a cretina que reivindicou a “igualdade para homens e mulheres”, o “sexo sem procriação, casual”, o “fim do amor como objetivo feminino”? Tudo isso era realmente muito bacana, mas acabou se concretizando através de relações fugidias, típicas da contemporaneidade e dos homens histéricos. Atualmente é praticamente impossível escapar da nostalgia causada pelos velhos modelos de relacionamento.

Quando o desejo de um compromisso afetivo, de constituir e manter uma família, composta dos mais diferentes formatos, deixou de ser universal para tornar-se uma característica exclusivamente feminina?

terça-feira, novembro 02, 2004

Minha mulher, a solidão,
Consegue que eu não seja triste.
Ah, que bom é o coração
Ter este bem que não existe!

Recolho a não ouvir ninguém,
Não sofro o insulto de um carinho
E falo alto sem que haja alguém:
Nascem-me os versos do caminho.

Senhor, se há bem que o céu conceda
Submisso à opressão do Fado,
Dá-me eu ser só - veste de seda -,
E fala só - leque animado.

Fernando Pessoa


Não, não conto com ninguém. Já aprendi a exercitar essa máxima do egoísmo.

Expectativa zero = frustração sob controle.

Eu quero, você não quer. Eu preciso, você não tem para dar.

Triste sina a dos que insistem em viver contando com a quase ilusão de que compartilhar é preciso, necessário, possível até.

Um, dois, três exemplos recentes remetem a separações. Gente que vai embora na hora errada, que se manda quando o outro mais precisa.

O que merecem esses seres? Uma bofetada, para aprender a respeitar a fragilidade alheia.

Ora. Nada alheio interessa, a não ser que traga consigo alguma garantia.

De todo modo, assusta a ligeireza das finalizações. Bastam alguns planos interrompidos, desejos obstaculizados, vontades contrariadas para que o tudo vire nada rapidamente. E a vida segue por caminhos diversos, apartados os que sonharam e ousaram juntos, como se nada houvesse ou tivesse havido. Difícil acostumar, sobretudo quando se é vítima da suposta crueldade.

segunda-feira, novembro 01, 2004

Zwischenfall

Ich schreibe dir
noch immer
daß ich dich liebe

Ich schreibe
daß ich dich liebe
und daß du nicht da bist

aber daß ich nicht allein bin:
denn ich
sitze neben mir

Ich sehe mich an
und nicke
und strecke die Hand aus

Ich rühre mich an
und freue mich
daß ich noch da bin

Ich bin froh
daß ich nicht allein bin
wenn ich dir schreibe

Ich hebe den Kopf
und sehe:
Ich bin nicht mehr da

Bin ich
zu dir gegangen?
Ich kann nicht mehr schreiben

Erich Fried (1921-1988)
Excesso de sinceridade ou o direito à mentira

Nada mais insuportável do que um homem que não mente. O homem sincero é sempre o pior canalha. O homem dito sincero e virtuoso é o mais vagabundo dos canalhas.

O amor não sobrevive em um ambiente sem mentiras. A sinceridade extremada, esse fundamentalismo dos pobres de espírito, torna a vida insuportável, autoritária, sem fantasias. As pequenas mentiras dão graça ao lar-doce-lar. Se eu tivesse um caminhão, escreveria no pára-choque: uma mentira a mais é um desgosto a menos. Como são arrogantes os que dizem dizer somente a verdade, essa impostura cristã de terceira categoria. Quem tiver suas verdades que me poupe delas. Que mintam e me agradem, que mintam e me bajulem, que mintam e divirtam a humanidade...